“O meu país sabe às amoras bravas
no verão.
Ninguém ignora que não é grande,
nem inteligente, nem elegante o meu país,
mas tem esta voz doce
de quem acorda cedo para cantar nas silvas.
Raramente falei do meu país, talvez
nem goste dele, mas quando um amigo
me traz amoras bravas
os seus muros parecem-me brancos,
reparo que também no meu país o ceú é azul.“
Eugénio de Andrade, 1988
Eugénio de Andrade, poeta Português já falecido, oriundo de uma família humilde de uma pequena aldeia da Beira Baixa. No seu poema, as amoras, não esconde o sentimento dual que nutria em relação ao seu país, Portugal.
Compara o sabor do seu país às doces amoras bravas do verão, ao mesmo tempo que reconhece a sua pequenez. Um país alegre, onde se sente o desejo de cantar, apesar das silvas e circunstâncias difíceis que nele se viviam.
Demonstra no seu poema uma certa falta de admiração pelo seu país, reconhecendo-lhe alguma falta de sabedoria, elegância e horizontes (os seus muros), mas com um simples gesto de generosidade e amizade, quando um amigo lhe traz amoras bravas, todos os muros lhe parecem brancos ou por outras palavras, puros e luminosos. Termina o poema afirmando que o ceú em Portugal é azul, quase como dizendo que ali se pode ter uma vivência feliz.
Eugénio de Andrade tinha sobretudo uma imensa paixão pelas coisas da terra, e acredito pela paisagem Portuguesa. Paixão que influenciou toda a sua notável obra. Se desejar conhecer mais acerca da sua poesia, seguir esta página é uma boa opção. https://www.facebook.com/groups/eugeniodeandrade2014/?ref=share
Portugal é hoje um país mais moderno, aberto e muitos destinos em Portugal nunca estiveram tão na moda como agora. Lisboa, a capital Portuguesa por exemplo, está entre os destinos favoritos de muitos viajantes de todas as partes do mundo e a atrair muitos nómadas digitais que escolhem Lisboa ou outras partes de Portugal para se fixarem por um período de tempo.
No entanto, o sentimento de coração dividido em relação a Portugal ainda está hoje muito presente em muitos portugueses. Uma grande fatia da população portuguesa vive com um rendimento familiar abaixo da média europeia o que promove esse sentir.
Isto para vos dizer que chegou Agosto, o tempo das amoras bravas. A altura do ano em que ansiosamente regresso ao meu país, Portugal, e onde me sinto verdadeiramente feliz e em casa, onde o ceú é mais azul e onde a generosidade da gente de uma aldeia (entre tantas), rodeada por um rio, me enternece. Janeiro de Baixo na Beira Baixa. Também para mim os seus muros me parecem brancos, e dentro deles encontro paz.

Fotografia da aldeia de Janeiro de Baixo tirada por um amigo, Filipe C. Branco.

Janeiro de Baixo, na Beira Baixa. Uma bonita aldeia de Xisto onde tenho raízes, excelentes memórias de infância e onde aprendi a cozinhar vendo cozinhar a minha avó, pais e tias.
Na aldeia o tempo pára. Sentimos a terra, vemos as estrelas, escutamos o silêncio, mergulhamos inteiros no rio que corre. Vamos à apanha das amoras silvestres e estreitamos fraternos laços de amizade e amor.

Na aldeia o tempo pára, também para cozinhar. Cozinhar com alguns alimentos acabados de colher da terra. Alguns deles chegam sem nome nem cartão à soleira da porta.

Cesta com legumes acabados de colher, frutas e ovos caseiros oferecidos por pessoas bonitas da aldeia de Janeiro de Baixo.
As próximas receitas que publicarei serão receitas da cozinha regional Portuguesa, inspiradas e preparadas durante as férias no Alentejo, na Extremadura e nas Beiras, no tempo das amoras bravas.